quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Grupo "A Imagem Escrita" entrevista Marco Bogado Lins.


Qual o seu escritor preferido?


Eu mudo constantemente de opinião em relação a esta pergunta. Já tive como “escritor preferido” Guimarães Rosa, Nietzsche, Clarice Lispector, Jorge Amado e possivelmente outros que não me lembro.

Hoje eu diria que o meu preferido é um filósofo, chamado André Comte-Sponville. Ele escreveu o livro Pequeno Tratado das Grandes Virtudes. Dei uma lida superficial em outro livro dele que adquiri recentemente e estou louco para ler.

Qual o seu livro preferido?

Livro eu tenho um favorito há muito tempo, acho que há uns 13 anos: Assim Falou Zaratustra. Mas ele ainda pode mudar.

O que um texto precisa para te chamar atenção?

É difícil definir. Eu sou “readholic”, porém eu diria que eu prefiro os textos que possuem algum pulo do gato. Algo que faça você transitar por ideias inusitadas, sejam reais ou imaginárias. Por isto, gosto muito de textos filosóficos. Porém, também não gosto de leituras complicadas, o pulo do gato tem que vir naturalmente, com exceção de textos mais técnicos, como por exemplo de economia, sociologia ou de psicanálise. Recentemente li a Riqueza das Nações de Adam Smith, que não chega a ser complicado, mas é denso. Mas mesmo estes mais técnicos podem ser mais simples. Eu citaria como exemplo o  Contardo Calligaris.

Qual a importância da disciplina pra um escritor?

É tudo. A disciplina, em minha opinião, é o que separa os escritores amadores daqueles que se pretendem se tornar profissionais. E isto não digo em relação a qualidade, mas sim como ofício. Talvez hajam escritores amadores melhores que escritores profissionais, porém dificilmente eles se projetarão mais do que os que possuem disciplina.


Apenas uma ressalva: disciplina como o exercício constante de escrever. Obviamente existirão mil formas de se disciplinar a escrever.
 


Como se atinge o publico do século XXI que majoritariamente, não tem tempo pra ler e opta por leituras mais simples e rápidas?

Acho que esta pergunta fica para cada escritor responder. Eu tento ser simples e rápido. Meu intuito é que a maior parte dos meus textos sejam fáceis, que a leitura seja fluvial, com algumas exceções.  Quero ser lido por muitas pessoas. Obviamente ainda não consegui, mas pretendo alcançar este objetivo, seja com meu trabalho na agência ou como escritor, propriamente dito. E não teria nenhum problema em ir ao Faustão ou a Ana Maria Braga. Sei lá. Acho que o artista tem que ir aonde o povo está.  Porém, há diferentes formas para cada um e o mercado será cada vez mais aberto para as diferenças.

Qual é o sentido da escrita para você?

Difícil esta pergunta. Acho que a escrita não tem sentido definido. Cada hora terá um. No meu caso, escrever é parte integrante da vida. Seria o mesmo sentido da vida, que também não tem nenhuma definição possível. Cada hora a vida tem um sentido, inclusive, em alguns momentos, não tem sentido algum.

Em seu livro, você comenta que vê a poesia nas notícias de jornal, mas que não as transformaria em filmes, por exemplo, para não perder a magia. Como a poesia passa pelo seu dia a dia e como você seleciona seus temas?

No meu livro, na verdade, eu “parafraseio” uma frase da amiga Duda. Ela sempre diz que Deus é um péssimo roteirista. Isto porque muitas vezes vemos coisas em filmes que dizemos que “isto nunca aconteceria na vida real”, “é muito forçado” e comentários do gênero. Porém, lendo notícias de jornal, por exemplo, você vê coisas ainda mais inacreditáveis.  Acho que o grande lance é isto, perceber a poesia do cotidiano, da vida, dos pequenos e grandes acontecimentos.

Quanto aos meus temas, eu não sei se eu os seleciono. É mais fácil dizer que eles me selecionam, tanto no meu trabalho, que me disciplina a escrever sobre assuntos variados, quanto no meu blog, que o tema aparece sem explicação. Muitas vezes penso num tema, mas não consigo desenvolvê-lo literariamente falando. Enquanto outros, sem explicação possível, saem como uma catarse, ou uma epifania.

Muitas de suas crônicas falam sobre as cidades. Como você definiria a vida de um carioca em São Paulo?

Hoje em dia eu sou mais adaptado. Mas foi muito difícil a minha adaptação. São Paulo é uma conquista. Para quem vem de fora, cada passo é uma vitória aqui. Porém, depois de algumas delas, você acaba fazendo parte da cidade. Fica mais difícil sair daqui. Hoje, acredito que dificilmente eu voltaria a morar no Rio.


Como você relaciona a sua formação escolar com a decisão em se tornar um escritor?

Eu estudei num colégio muito artístico, vamos dizer assim. Muitos dos meus colegas de colégio trabalham na área, outros não. Porém, o importante é que vivenciamos a arte no colégio como algo natural. Eu acredito que devo muito o que sou hoje ao Colégio Pedro II, onde estudei. Já a faculdade, apesar de ter me acrescentado, sem dúvida, não acredito que tenha sido tão fundamental.

Como você vê hoje a situação dos impressos de um modo geral, como livros ou jornais, com todo o avanço da internet e infinitas informações ao alcance?

Os impressos estão em fase de transição para a plataforma digital. Dificilmente acabarão, pelo menos a um médio prazo, mas eu arrisco dizer que eles serão complementares a internet.

Eles inclusive estão se aproveitando de seu poder econômico para conseguirem ser também veículos importantes na web. Mas tenho certeza que muitas empresas não conseguirão fazer esta transição tão bem. Nos Estados Unidos algumas empresas já estão com dificuldades, como o tradicional New York Times, por exemplo. Quem diria há dez anos atrás que o maior investidor deste jornal seria um mexicano?

Após lançar livros com temas do cotidiano você pensa em lançar algum livro de literatura?

Acredito que meu livro é de literatura, ainda que cotidiana... Se você se refere a um livro de contos ou um romance, eu quero muito. Porém, meu texto ainda não  amadureceu o suficiente para tal. Espero que isto aconteça em algum tempo. Os meus textos mais longos acabam “virando” peças de teatro.


A tv apesar de ainda ter a grande audiência da população em geral, você a considera tão persuasiva ao ponto de jamais perder esse status para a internet?

A TV como a conhecemos deve acabar. Porém, o poder da mídia deve migrar para a internet, conforme eu falei mais acima. Isto, porém, não deve significar que manterão o mesmo poder que tem hoje.

A internet permite que o público possa ser mais seletivo quanto ao conteúdo. Não estou me referido obviamente com a qualidade que gostaríamos que ele tivesse, mas com o gosto que ele, o público, efetivamente tem. O público irá atrás daquilo que ele quer, a mídia, no máximo, se posicionará adequadamente para ser o fornecedor disto. Acredito que a concorrência poderá ser muito maior.

Quem é você com a escrita?

Acho que esta pergunta quem deve responder são os leitores. Se a pergunta fosse como eu me vejo na escrita, eu responderia que sou um bom escritor de terceira categoria.

Quem é você sem escrever?

Sou anormal, que nem todo mundo.

Quem é você enquanto escreve?

Alguém que eu não sei definir. Talvez seja outra pergunta para os meus leitores.

E depois de escrever?

Sou crítico, fico lendo e relendo, adorando e odiando, cortando e reescrevendo, até achar que o texto está pronto. Mesmo assim, o texto nunca “está” pronto, somente quando for “publicado”. Até lá, muita coisa pode rolar.

Você sente mais satisfação/prazer no processo de escrever o texto, ou depois de pronto? Por que?

Geralmente durante o processo, ou antes, quando vem o entusiasmo da ideia. Porque muitas vezes quando escrevo, graças a Deus, sou acometido por uma epifania. Isto, claro, nem sempre acontece, mas acho que é o que explica porque eu gosto tanto de escrever mesmo quando não estou “possuído”.

Depois de escrever é um parto. É horroroso. Fico editando, achando que não está bom o suficiente, ou achando que o negócio está bom demais. Sei lá, depois é que é o problema, o antes é o mais legal, sem dúvida e sem “a” dúvida.  Por isto, publicar é bom, porque te força a não mais pensar no texto, aí é partir para o próximo.


Editado por: Julio de Ló

3 comentários:

  1. Editado por todos nós do "A imagem escrita"! Apenas organizei!
    Essa entrevista está interessantíssima. Mostrando relatos reais da vida de um autor. Uma oportunidade para entender um pouco mais sobre o fazer artístico. Marco Bogado Lins vale a pena ler e conhecer. Abraço a todos.
    PS: Valeu Bruno por postar.

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  2. agradeço galera. Estou divulgando e o pessoal tá gostando bastante. Obrigado pela oportunidade.

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  3. Estamos aí, Júlio!

    Obrigado, mais um vez, Bogado. Foi valioso demais ao grupo ouvir/ler suas experiências e, depois, seu blog. No mínimo, esclarecedor. rs

    Abraços!

    Por: Bruno

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